Na segunda mexi nas coisas da mãe, peguei todos os exames e amassei, um a um, guardei os laudos, ficha e documentos dela, guardei dois exames grandes de imagem onde vejo o tumor gigante, o resto amassei, chorava que nem criança, abri todas as coisas da minha casa, joguei fora minha Barbie (havia ganhado da minha tia quando era criança ) e o Ken ( que é um boneco que a vó achou nos matos e fez até roupa e me deu), joguei fora pastas com músicas que na adolescência eu queria aprender a cantar, havia muito do Kid Abelha, Biquíni Cavadão, Legião Urbana e outras, havia fotos da Usurpadora, outras novelas que mexiam demais comigo. Engraçado que eu comecei a ter problemas com meu corpo quando percebi que nunca seria como a Usurpadora, corpo e rosto, até pintei o cabelo uma vez, joguei fora post da Maysa que eu via em jornais, do Kid Abelha que era minha banda preferida na adolescência, joguei fora roupas e lenços meus, alguma coisa da mãe.
Jogar isso tudo fora e as coisas da mãe foi como admitir que a perdi, aceitar que aquilo tudo não me serve mais de fato, tudo já passou, não adianta guardar o que não serve mais, foi doloroso, chorei o quanto precisava e ainda sim não consegui juntar as coisas dela que servem pra doação, na verdade estão juntas e organizadas mais tem coisas que quero pra mim, eu guardei os lençóis dela e fiquei tentando sentir o cheiro como se fosse um resquício de vida ali mas não tinha, o tempo é implacável. guardei o copo que ela gostava, a escova de dente, a prótese dentária e o livro de oração, tinha uma foto minha porque ela sempre me mantinha nas suas orações, a foto é ridícula, eu sempre dizia.
Guardei meus diários, dois na verdade, li e só falava de meninos, de como eles não olhariam para mim, me lembrei porque na adolescência o livro a marca de uma lágrima era meu favorito, tem uma foto minha toda riscada, onde não tem como me identificar e fico pensando que desde aquela época eu já tinha problemas com a minha imagem, era 2006. Tem uma foto da mãe também, ela seria que só, bateu mais saudade, eu guardei os diários, o resto joguei fora. Senti que estava tentando encher meus pulmões de vida novamente, ajeitar as coisas, aos poucos deixar ir, sinto que foi um dos processos mais importante do meu luto, a casa está bem limpa e me senti dela de novo, queria voltar.
Relatório a psicóloga.
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