segunda-feira, 25 de setembro de 2023

Você precisa saber

 A mãe precisa saber que não tenho tido vontade de morrer, que agora entendo uma coisa: sempre que quero seu abraço quero morrer, porque no final das contas tenho a consciência de que ela não está mais aqui e quero ir onde ela está e abraçar, qual o objetivo? Cessar minha dor naquele momento.

 Mas a mãe precisa saber que não quero de fato morrer, eu gosto de viver, eu gosto da vida, não concordo com a maioria das coisas, mas não quero ir embora, quero que minha dor se vá, é diferente. Querer seu abraço nesses momentos e querer morrer por saber que só assim é egoísta demais, pesado demais, cru demais.

 Ela sabe que ainda tenho que resolver uma porção de coisas aqui, sei também que minha existe é para resolver tantas pendências que me pergunto como darei conta, mas todos os dias eu sinto a falta da segurança do seu amor e afago (que egoísta que sou), quero morrer para que minha dor acabe, tenho tido com frequência que não sei viver e que não sou para vida.

 Como não sou se gosto de viver? Gosto de estar com outras pessoas, gosto de comer, conhecer outros locais, da sensação de quando se aprende algo novo ou algo que na minha infância não conseguia, que gosto de beijar na boca e dividir a vida com outra pessoa, que gosto do encantamento de uma amizade ou de um amor, de plantar feijão e milho, de trabalhar, de ser um bicho no mato que engano a todos com ideologias rasas e com senso comum.

 Sinto a falta do seu amor nos dias ruins, do seu afago, lembro dos seus conselhos de quando erro e lembro que realmente sentava e conversava comigo, brigava depois se eu errasse novamente, foi a pessoa que mais me deu segundas chances porque acreditava que mudaria, eu mudei, mão sou um monstro, mãe.

 A mãe precisa saber que quero seu abraço e voltar para vida, quero continuar aprendendo, quero a felicidade (não queria a tristeza mas não posso ignorar que sempre a terei), quero festas, abraços, amor. Será que eu consigo ter uma existência apenas lá com ela? Hoje me olho e penso: quanto egoísmo, você quer apenas o abraço dela para não sentir a dor, porque o abraço dela vem com amor, com segundas chances, com consideração, com casa. Ela merece isso? 

 Sou injusta, mãe.

 Mas preciso que saiba que queria tudo isso e que você provasse o gosto do sorvete, dos lugares, dos amores, que você se orgulhasse do que tento ser e me aconselhasse pelo que faço de ruim, que você não é apenas meu porto seguro, que sou teu porto seguro, que fui quando você precisou e que sempre seria. O amor que você me mostrou, um amor falho, com traumas, com erros, também transforma, o amor nem sempre será bonito. 

 Queria não ter medo, te busco para ter a força mas ainda não tenho, te busco e me busco, chego a ser ordinária comigo, mas não consigo nem resolver o que minha psicóloga pediu: do que você se perdoa? Eu não me perdoo, por que eu perdôo as pessoas e não a mim? Você diria que não sou uma pessoa ruim, você disse isso poucos dias antes de morrer, eu ainda consigo escutar sua voz.

 Eu não quero morrer, eu quero viver em paz comigo mesma, isso passar pelo amor e falta de mãe que sinto, falta de um porto seguro, que eu possa descansar, pelo meu egoísmo, pelo luto, eu não quero morrer, tenho ânsia de ser feliz, mesmo quando me faço o contrário. Você está feliz?